Segurança pública sem preconceitos: um compromisso com a Constituição e com a vida
- jordhanlessa
- 20 de nov.
- 8 min de leitura

Para quem está na linha de frente da segurança pública, cada abordagem é uma decisão de segundos que pode proteger vidas — ou violar direitos. Quando a pessoa abordada é LGBTQIA+, negra ou uma pessoa com deficiência, o risco de que preconceitos históricos entrem em cena é ainda maior. E é justamente aqui que entra a formação profissional baseada na Constituição Federal e nas leis em vigor.
Este texto é um convite direto a você, profissional de segurança, que quer atuar com firmeza, mas também com legalidade e respeito. Vamos mostrar como a formação adequada ajuda a cumprir a Constituição, reduzir conflitos, fortalecer a imagem da corporação e proteger quem mais precisa — sem deixar ninguém para trás.
O que a Constituição Federal exige de quem está na segurança pública
A Constituição Federal de 1988 é o ponto de partida da atuação de qualquer agente de segurança. Ela não é apenas um livro distante: é o manual que dá sentido ao seu distintivo, à sua farda e ao seu poder de polícia.
Alguns princípios constitucionais que orientam diretamente o seu trabalho:
Dignidade da pessoa humana: ninguém pode ser tratado como “menos gente” por ser LGBTQIA+, negro, pessoa com deficiência, pobre ou morador de periferia.
Igualdade: o art. 5º garante que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Na prática, isso significa que a sua abordagem não pode mudar por causa de cor da pele, identidade de gênero, orientação sexual, condição de deficiência ou expressão de gênero.
Legalidade: você só pode fazer o que a lei permite. A discriminação não é só imoral; ela é ilegal.
Além disso, a CF reconhece direitos específicos de pessoas com deficiência, que são detalhados posteriormente pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei Brasileira de Inclusão – Lei nº 13.146/2015), reforçando o dever do Estado — e, portanto, da segurança pública — de garantir acessibilidade, respeito e proteção contra qualquer forma de violência ou tratamento degradante.
Nos últimos anos, decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e leis específicas têm reforçado esse cenário. Um exemplo é o entendimento de que a LGBTfobia se enquadra no crime de racismo, ampliando a proteção a esse grupo. Isso aumenta a responsabilidade de quem atua na segurança pública: qualquer forma de violência ou tratamento discriminatório pode ter consequências disciplinares, civis e criminais.
Em resumo: não existe “opinião pessoal” acima da Constituição. No serviço, o que manda é a lei. E é a formação de qualidade que ajuda a transformar esse princípio em prática diária.
Racismo, LGBTQIA+ e pessoas com deficiência na segurança pública: entender o problema para não repeti-lo
Falar de racismo, de violência contra a população LGBTQIA+ e contra pessoas com deficiência não é acusar toda a categoria de segurança pública. É reconhecer problemas estruturais para ter condições de enfrentá‑los com profissionalismo.
Racismo estrutural e institucional
O Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra, ano após ano, que a maioria das vítimas de homicídio no Brasil é negra — muitas vezes mais de 75%. Isso não significa que agentes individuais sejam “maus por natureza”; significa que o país foi construído historicamente com desigualdades profundas, e a segurança pública não ficou fora disso.
Racismo estrutural: quando as regras sociais, econômicas e políticas produzem desvantagens para pessoas negras, mesmo sem alguém “planejar” isso diretamente.
Racismo institucional: quando uma instituição, por ação ou omissão, mantém práticas que resultam em prejuízo para pessoas negras — por exemplo, abordagens seletivas, desconfiança automática ou uso desproporcional da força.
Violência contra população LGBTQIA+
Relatórios de organizações como o Observatório de Mortes e Violências LGBT+ apontam que pessoas LGBTQIA+ sofrem violências graves e até homicídios com frequência alarmante. Muitos casos nem chegam à delegacia por medo de sofrer chacota, humilhação ou descrédito ao procurar ajuda.
Na prática do dia a dia, isso aparece quando:
um boletim de ocorrência não é registrado com seriedade porque a vítima é uma pessoa trans, uma lésbica ou um homem gay;
um agente ri, faz piadas ou usa pronomes errados, deslegitimando a identidade da pessoa;
a abordagem é mais agressiva com jovens negros ou pessoas LGBTQIA+ simplesmente pela aparência ou forma de se vestir.
Violência e discriminação contra pessoas com deficiência
Pesquisas de organismos internacionais (como a ONU) e dados nacionais apontam que pessoas com deficiência também enfrentam altos índices de violência, especialmente mulheres com deficiência intelectual, sensorial ou psicossocial. A barreira aqui não é só o preconceito, mas também a falta de acessibilidade na comunicação e no atendimento.
Na rotina da segurança pública, isso pode aparecer quando:
um agente ignora a forma de comunicação da pessoa surda e não busca intérprete de Libras ou alternativa;
um boletim não é registrado adequadamente porque a vítima tem deficiência intelectual e o relato exige paciência e técnica;
uma pessoa com mobilidade reduzida não é encaminhada de forma segura para a viatura ou para a delegacia, correndo risco de queda ou de dor intensa.
Em todos esses casos — racismo, LGBTfobia e capacitismo (preconceito contra pessoas com deficiência) —, além de ferir a dignidade da pessoa, as condutas ferem a Constituição e podem caracterizar discriminação. A formação é justamente a ferramenta para reconhecer esses comportamentos, muitas vezes automáticos, e substituí‑los por práticas profissionais e legais.
Formação profissional: o que muda na prática da rua
Treinamentos pontuais, de uma tarde só, não dão conta de uma mudança tão complexa. O que faz diferença é uma formação contínua em direitos humanos, diversidade e legislação aplicada ao trabalho policial, envolvendo raça, gênero, orientação sexual, identidade de gênero e deficiência.
O que essa formação traz para o dia a dia
Linguagem respeitosa e técnica
Aprender a usar o nome social e o pronome correto com pessoas trans.
Evitar termos pejorativos ou piadas, mesmo “entre colegas”, quando a vítima ou o abordado é LGBTQIA+, negro ou pessoa com deficiência.
Falar de forma clara e objetiva, explicando o motivo da abordagem e, quando necessário, adaptando a comunicação (por exemplo, linguagem simples para pessoa com deficiência intelectual, contato visual e apoio visual para pessoa surda oralizada).
Abordagem sem discriminação
Basear a abordagem em fundadas suspeitas, não em aparência, raça, deficiência ou expressão de gênero.
Garantir que a revista pessoal seja feita respeitando a dignidade, evitando toques desnecessários, comentários ou exposição pública.
Em caso de pessoa com deficiência, levar em conta limitações de mobilidade, uso de cadeira de rodas, bengala, cão-guia ou outros recursos, evitando retirar equipamentos de apoio sem necessidade.
Registro adequado da ocorrência
Incluir, quando cabível, a motivação de ódio ou discriminação (racismo, LGBTfobia, capacitismo) no boletim, para que haja estatística e responsabilização adequada.
Registrar corretamente, com sensibilidade, a condição de deficiência da vítima quando isso for relevante para a proteção e para a investigação, sem usar linguagem ofensiva ou antiquada.
Orientar a vítima sobre seus direitos e sobre os próximos passos, certificando-se de que ela compreendeu (por exemplo, pedindo que repita com suas próprias palavras o que foi explicado).
Proteção da vítima, não revitimização
Evitar que a pessoa tenha que repetir o relato várias vezes na frente de curiosos.
Oferecer atendimento em espaço reservado sempre que possível.
No caso de pessoas com deficiência, garantir acessibilidade física (rampa, cadeira) e comunicacional (intérprete, material escrito claro, tempo para o relato).
Exemplo prático
Imagine a seguinte situação: uma pessoa trans (pode ser uma mulher trans ou um homem trans) procura a delegacia após ser agredida na rua com insultos transfóbicos e ameaças. Dois cenários:
Sem formação adequada:
O agente ri, chama pelo nome de registro sem perguntar a preferência, comenta com colegas, relativiza a agressão (“é só xingamento, deixa pra lá”).
Se a pessoa trans também tiver uma deficiência (por exemplo, mobilidade reduzida), ninguém se preocupa em acomodá-la adequadamente, ela espera em pé, com dor.
Resultado: a vítima desiste da denúncia, a subnotificação continua, a violência se repete.
Com formação adequada:
O agente pergunta como a pessoa prefere ser chamada, registra o nome social, anota os insultos como elementos de possível crime com motivação de ódio, explica os próximos passos com seriedade.
Se houver deficiência associada, o agente garante um lugar para sentar, fala em ritmo adequado, verifica se a pessoa compreendeu e, se preciso, busca apoio para acessibilidade (intérprete, acompanhante, apoio físico).
Resultado: a vítima sente-se protegida, a ocorrência entra na estatística e o agressor pode ser responsabilizado.
A diferença entre um cenário e outro não é “ideologia”: é formação profissional baseada na lei e na Constituição, aplicada de forma concreta à realidade da população LGBTQIA+, negra e com deficiência.
Caso ilustrativo: quando a capacitação muda números e histórias
Vamos imaginar um caso baseado em experiências reais de programas de capacitação em direitos humanos.
Uma unidade policial de médio porte, responsável por uma região urbana de 200 mil habitantes, decide implementar um ciclo anual de formação em atendimento à população LGBTQIA+, enfrentamento ao racismo institucional e inclusão de pessoas com deficiência no atendimento de segurança:
80% do efetivo passa por um curso de 20 horas, com foco em:
Constituição Federal e decisões recentes do STF;
conceitos básicos de racismo, LGBTfobia e capacitismo;
simulações de abordagem e atendimento a vítimas LGBTQIA+, negras e com deficiência.
Seis meses depois, a própria unidade levanta alguns indicadores internos:
Aumenta em 40% o registro de ocorrências em que a vítima declara ser LGBTQIA+, pessoa negra ou pessoa com deficiência, e/ou relata motivação de ódio.
Isso não significa que “a violência aumentou”, mas que as pessoas passaram a confiar mais em registrar.
As reclamações formais por tratamento desrespeitoso caem em cerca de 30%.
Em entrevistas qualitativas com lideranças comunitárias, coletivos LGBTQIA+, movimentos negros e conselhos de pessoas com deficiência, há relato de maior disposição de dialogar com a polícia.
Para o profissional, os ganhos são claros:
Menos conflitos em abordagem.
Maior segurança jurídica nas ações.
Reforço da imagem de agente do Estado que protege a todos, sem distinção.
Esse tipo de resultado só aparece quando há formação planejada, constante e alinhada à Constituição Federal.
Caminho para a mudança: por onde começar a se capacitar agora
Você não precisa esperar uma grande reforma institucional para começar a agir de forma mais alinhada à lei e aos direitos humanos.
Alguns passos práticos:
Estudo constante da legislação
Revisite os artigos da Constituição ligados a direitos fundamentais e proteção de grupos vulneráveis.
Acompanhe decisões do STF sobre racismo, LGBTfobia e direitos das pessoas com deficiência.
Atualização em direitos humanos, diversidade e inclusão
Participe de cursos oferecidos por escolas de governo, academias de polícia, universidades e entidades sérias.
Busque materiais que traduzam esses temas para a realidade da segurança pública, com foco em raça, gênero, sexualidade e deficiência.
Consumo de conteúdo especializado
Assista a vídeos, palestras e debates que tratem de segurança pública sem preconceito, com casos reais e linguagem prática.
Mantenha o hábito de se atualizar, como quem “treina a mente” da mesma forma que treina o físico.
Se você quer um espaço pensado exatamente nessa direção — segurança pública sem preconceito, formação continuada e foco na prática com LGBTQIA+, população negra e pessoas com deficiência —, um próximo passo é se juntar a uma comunidade que discute isso de forma direta e acessível.
Conclusão: profissionalismo é cumprir a lei e proteger sem distinção
Atuar na segurança pública é carregar uma responsabilidade enorme: a de usar o poder do Estado para proteger vidas. Quando você decide se capacitar para atuar sem preconceitos contra a população LGBTQIA+, contra pessoas negras e contra pessoas com deficiência, você não está “fazendo um favor” a ninguém. Você está cumprindo a Constituição Federal, respeitando as leis vigentes e se fortalecendo como profissional.
Se este tema faz sentido para você e você quer continuar se formando, com exemplos reais,
discussões sobre legislação e práticas do dia a dia, o próximo passo é simples: inscreva‑se agora no meu canal no YouTube “Segurança Pública Sem Preconceito”: https://www.youtube.com/@segurancapublicasempreconceito.Lá, você encontra conteúdos contínuos para transformar conhecimento em ação e reforçar, todos os dias, o compromisso com uma segurança pública verdadeiramente para todos.
Fórum Brasileiro de Segurança Pública – Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023.https://forumseguranca.org.br
Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania – materiais sobre enfrentamento à LGBTfobia, racismo e violência contra pessoas com deficiência.https://www.gov.br/mdh
Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência) – Lei nº 13.146/2015.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm
Nações Unidas (ONU) – Relatórios sobre policiamento, direitos humanos e grupos vulneráveis, incluindo pessoas com deficiência.https://www.ohchr.org
Decisões do STF sobre equiparação da LGBTfobia ao crime de racismo (ADO 26 e MI 4733).https://portal.stf.jus.br


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